DOBLE FUERZA RELANÇA PIBES DE BARRIO: ENTREVISTA COM O VOCALISTA HUGO E COM MAXI BUENO DA PINHEAD RECORDS



Clima ao mesmo tempo de ruas e de festa. Estar em uma manifestação obreira, em um estádio de futebol, lado a lado com a pessoa amada ou em uma roda punk. Eis a música que o argentino Doble Fuerza nos traz já há mais de três décadas: uma mistura exata de consciência social, romantismo e diversão, transformados em temas viciantes que não deixam indiferente tanto o admirador de Ramones quanto o versado em street punk inglês. Seu maior clássico, o debut Pibes de Barrio, lançado pelo próprio grupo em 1994, agora ganhará versão em vinil – e o Monophono pediu para o vocalista Hugo Irisarri, remanescente único daquela formação, puxar pela memória e contar pra gente o clima da época e o que envolveu a feitura do disco, em um bate-papo exclusivo. Confira!                

Monophono: Como era o punk rock argentino em 1994? Existia alguma banda do país que tenha influenciado o Doble Fuerza, ou os Ramones ganham todo o crédito?

Hugo Irisarri: Nós começamos com o Doble Fuerza em 1987, e por aquele tempo existiam muitos conjuntos em crescimento no país – alguns conseguiram solidificar suas carreiras, outros ficaram pelo caminho, é natural. Nossa influência musical vem desde o street punk, passa pelo punk rock 77, e isso tudo misturado a algo do bom e velho rock’n’roll tradicional também.

Monophono: E a própria Argentina? Qual era o clima do país no momento em que o Doble Fuerza surgiu?

Hugo: Vivíamos enfim uma democracia, porém com problemas econômicos que se refletiam na classe trabalhadora – como sempre acontece na América Latina, você sabe…

 Monophono: Quanto tempo da formação da banda até vocês terem canções suficientes para gravar um álbum? Você se recorda?

Hugo: Mais ou menos uns seis ou sete anos, foi o tempo que levou para chegarmos ao primeiro álbum.

Monophono: Pibes de Barrio foi editado de maneira independente por vocês. Existiu a busca por um selo naquele período? De que forma vocês chegaram à decisão de auto-financiar essa estréia?

Hugo: Sim, tivemos algumas ofertas vindas tanto de grandes companhias multinacionais quanto de selos independentes menores; mas, ao passo que conseguimos juntar dinheiro suficiente graças aos shows que fizemos durante aquele período, decidimos que era melhor criar nosso próprio selo, o DF Records, para cuidar desse lançamento inaugural.

 Monophono: Quais as recordações do tempo em estúdio para gravar o Pibes de Barrio?

Hugo: Aquela foi uma etapa de total aprendizagem pra gente, foi ali onde começamos a adquirir muita da experiência que utilizaríamos mais para frente em nossa carreira. Mas a principal e melhor recordação é justamente a da felicidade de gravar nosso primeiro disco! Isso é inesquecível.

 Monophono: Dada a qualidade incrível que cada canção do álbum possui, vocês nutriam boas expectativas em relação ao Pibes de Barrio na época?

Hugo: A essa altura já éramos bem conhecidos na Argentina, e um número considerável de pessoas comparecia aos nossos shows. Tínhamos expectativas muito boas em relação a tudo – e elas felizmente se cumpriram. Foi um disco com ótima vendagem, tanto em CD quanto em cassete. Hoje o álbum já conta com três reedições em CD, uma edição em fita K7 e agora teremos uma versão em vinil, a cargo da Pinhead Records.

Monophono: As letras já tratavam dos tópicos favoritos do Doble Fuerza: amor, protesto, cerveja e futebol. A personalidade do grupo estava formatada ainda no berço?

Hugo: Sim, desde o começo. Aliás, como sou eu mesmo o autor das letras do Doble Fuerza, desde o “Pibes de Barrio” até agora, pode-se dizer que é a minha própria personalidade que está presente ali (risos)!

 Monophono: E qual era a relação de vocês com as outras bandas do período? Era de camaradagem ou de rivalidade?

Hugo: De camaradagem, sempre! As bandas eram todas nossas colegas.

 Monophono: Um álbum clássico assim merecia mais relançamentos de 94 para cá… Alguma razão específica para isso não ter ocorrido?

Hugo: Nenhuma (risos)!

Monophono: Você ainda possui contato com o pessoal que gravou o disco? O que fazem hoje em dia?

Hugo: Claro, tenho contato com a maioria deles. Porém, não sei bem a que se dedicam agora… A maioria daqueles caras não tinha a pretensão de fazer da música sua real profissão.

 Monohpono: Quais os temas do álbum que não podem faltar em uma apresentação do Doble Fuerza?

Hugo: Disturbios”, “Morir de Amor”, a faixa-título… Temos um pré-setlist de mais ou menos 30 músicas, e no geral tocamos por volta de 20 temas em cada show. E com dez discos gravados está cada vez mais difícil eleger quais canções iremos tocar ao vivo…

Monophono: Hoje, 26 anos depois, o que Pibes de Barrio representa para você, como músico e também como fã de música?

Hugo: Para mim não resta dúvidas: é o grande clássico do Doble Fuerza, à frente de toda a nossa discografia.

PINHEAD RECORDS

Claro que um selo dedicado ao punk rock, no país mais ramônico do mundo, só poderia ter um nome-homenagem ao quarteto liderado por Joey! Sediada em Rosário, na província de Santa Fé, a Pinhead Records é a gravadora mais representativa do estilo em terras portenhas, e, sem exagero algum, em toda a América Latina – é a responsável pela edição de material de muitos dos grandes nomes do punk argentino (Mal Momento, Bulldog, Katarro Vandaliko, Mal Pasar, e agora cuida dos relançamentos do Flema) e internacional (Millencolin, No Fun At All, o nosso Ratos de Porão e, obviamente, alguns projetos relacionados aos Ramones, como álbuns solo de CJ e o ao vivo do The Ramainz, com Marky e Dee Dee). Agora aventura-se no vinil, e prepara-se para muito mais – como Maxi Bueno, proprietário do selo, nos conta agora.

Monophono: A Pinhead Records é responsável pela edição/reedição de muitos dos principais discos do punk rock argentino. Fale um pouco mais sobre o selo pra gente aqui do Brasil.

Maxi Bueno: A gravadora teve início em 1990, primeiramente como um fanzine; a partir de 92 começamos a editar fitas cassete, e em 95 colocamos no mercado nosso primeiro CD. Continuamos a trabalhar ativamente até o dia de hoje, já com quase trinta anos de trajetória: são mais de 600 registros na nossa conta. De uns três anos pra cá começamos a mexer com discos de vinil, nosso formato preferido. Então agora estamos com vários projetos de lançamentos de LPs e boxsets direcionados a colecionadores, com clássicos do punk rock argentino (e de outras partes do mundo também).

Monophono: Como foi o processo para relançar o Pibes de Barrio em vinil?

Maxi: Era uma ideia que já tínhamos há tempos, mas estava complicado conseguir concretizá-la… Há alguns meses, já em meio à pandemia, conversava com o Hugo, e chegamos à conclusão que era um excelente momento para reeditarmos enfim esse clássico em LP – e cá estamos, trabalhando firme pra isso!

Monophono: O que teremos de mais atrativo nessa reedição, relacionada à sua parte visual?

Maxi: A principal mudança está na capa, desta feita com o tradicional logo da banda, e a foto que antes ali estava agora se encontra no encarte, junto com muitas outras nunca antes publicadas e que conseguimos graças ao grande fotógrafo Resaka, que tem um arquivo sensacional. Ademais, o álbum foi inteiramente remasterizado para essa nova edição, melhorando assim sua qualidade ao mesmo tempo em que a adapta ao formato LP.

Monophono: Trabalhar com o vinil hoje dá mais retorno (tanto financeiro quanto artístico) do que os outros formatos? Ou o CD permanece uma opção viável?

Maxi: Fabricar um disco de vinil ainda custa muito caro aqui na Argentina, mas assim mesmo temos um público bastante interessado nessas reedições especiais e numeradas. E também existe a possibilidade de satisfazer nossos próprios gostos pessoais, ao reeditar álbuns que marcaram tanto nossas vidas, e que agora nos deixam tão orgulhosos de enfim vê-los nesse formato. Seguimos vendendo CDs e temos um amplo estoque deles, mas o LP é mesmo o que encontra melhor saída no mercado atualmente.

Monophono: Vocês planejam lançar mais algum vinil do Doble Fuerza no futuro?

Maxi: No momento estamos completamente focados no “Pibes de Barrio” – oxalá que no futuro possamos reeditar também outros álbuns da banda! Pessoalmente gostaria muito de trabalhar com o “Ganar o Perder” e “Aloha”, mas primeiro vamos conferir como será o desempenho deste aqui. Saudações ao Monophono, e obrigado pelo apoio!

 

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