OS INCRÍVEIS PODERES DO PUNK ROCK ALÉM DA MÚSICA

A partir de hoje o Monophono contará com um colaborador direto de Berlim, meu amigo e baterista do Reactory, Cau-Z!

Guten Tag pessoal!

Meu nome é Cauê e após a retomada de contato com meu brother Vini depois de alguns anos, rolou um convite pra escrever aqui e como foi algo que nunca fiz, topei na hora. Pra gente se familiarizar um pouco, vou contar sobre a minha experiência pessoal de como raios vim parar aqui na terra dos chucrutes (eles não usam esse termo aqui) e como tocar Roque Pauleira e estar de saco cheio de tudo podem mudar a sua vida. Mudou a minha com certeza. Antes de mais nada, já vou avisando que o texto é longo e de cunho pessoal. Abra sua breja, pegue o seu pretzel e coloque a meia branca com a papete que a história vai começar. Metade dos anos noventa, sou estudante da E.E.P.S.G. Dr. Jose Fornari, estou na quarta série e devido à explosão da tchurma de Seattle, estou à todo vapor para me tornar um grunginho tupiniquim. O estilo vocês já sabem, calça bag jeans rasgada e com mensagens de rebeldia juvenil escritas à caneta bic, peita do nirvana, e congas tão velho e surrado que eu tinha que esconder da mãe senão ela jogava fora em um piscar de olhos.

Junto com amigos, pessoal mais velho da rua andava de skate e manjava algo já de Ramones, Dead Kennedys e Ratos. Eu também ia muito na Cd Baby, acho que rua Municipal, uma locadora de cds e pegava muita coisa pela capa ou nome, sem saber nada, gravava em fitas em casa o que curtia e assim ia. Como disse ainda estava grungero, comendo com farinha Mudhoney, Tad, Seaweed, Veruca Salt e as bandas mais famosas desse rolet também.

Até o dia em que eu e Gil, meu parceiro de som, fomos em um som no finado Planeta Rock na Faria Lima (confira um trecho do show no vídeo acima). Lá foi minha escolinha com certeza, vários shows memoráveis, mas o primeiro que presenciei o caos, explosão, catarse coletiva e uma das minhas primeiras ressacas homéricas, foi o show do Varukers em 1998 ou 99. Nunca havia visto aquilo: os punks mais toscos do abc, tudo junto, pogando e literalmente, destruindo o pico. Na hora de voltar pra casa, nós éramos os únicos ‘certinhos‘ que possuíam bilhete de tróleibus pra voltar pra casa. Entramos no buso e aquela pilha de punk pra fora…um mano pediu pra eu abrir a janela e todo mundo invadiu, motora ficou putasso mas não tinha muito o que fazer. Achei tudo aquilo tão foda, e me identifiquei na hora. Em uma semana estava caindo de cabeça para uma jornada sem volta sobre todas coisas punk hardcore. Idéias, som, visual, postura. Não vou romantizar o bagulho, tenho que falar que grande parte era também um ótimo habitat para o uso de entorpecentes e sair zuando por aí.

A partir do momento que ganhei minha primeira bateria tosca (valeu Mãe!), nunca mais parei de tocar e após as primeiras bandas, em 2005 rolou a oportunidade de fazer uma tour na Europa, na época com o Social Chaos. Eu tinha 23 anos, era uma máquina de fumar bagulho (ainda sou…), tomar breja e tocar bateria. Já havia feito pequenas viagens ao interior de SP ou em alguns estados do Sul pra tocar mas isso era outra parada. Antes de pegar avião, só andava com o subúrbio da CPTM de Santo André pra Mauá, geralmente pra ver som do Subviventes ou DZK. Depois de quase dois meses intensos tocando em squats, ocupas e centros auto gestionados, eu voltei pro Brasil e fiquei com essa inquietude de voltar pra lá. Não apenas para tocar, mas para tentar viver por lá também. Há de ter algo mais nessa vida além de apenas trabalhar, trabalhar e o uso desenfreado de entorpecentes, o que sinceramente, já não estava legal. Em 2009 fomos pela segunda vez ao velho continente e em 2010, a terceira. Mas nessa eu já estava indo pra ficar. Estava em um ponto na vida onde não tava rolando legal, relacionamento, carreira, honestidade com si próprio e dorgas.

Eu conhecia algumas pessoas por lá mas nada certo. Não sabia onde ia ficar depois da tour. Estava indeciso entre Helsinki, Amsterdam ou Berlim por conta de alguns amigues e por serem cidades fodas onde me pareceu possível viver uma realidade alternativa onde consumo, trabalho e dinheiro não significam tudo. Era o que eu achava. A utopia do squat. Queria viver e aprender essas paradas. Como ocupar e viver sem aluguel em com indivíduos que compactuam de interesses similares.

Olhando em retrospecto, sou muito grato de ter escolhido Berlim. Finlandês é um idioma praticamente impossível de aprender, Amsterdam já tava super lotada e Berlim me pareceu bem agradável e relativamente tranquila para uma capital. Além de ter o Köpi Squat, onde tive a oportunidade de fazer parte do coletivo, aprendendo e fazendo um pouco de tudo. Lavar banheiro, fazer o rango do comedor solidário, trampar no bar, fazer luz, som e PA, ir à manifestações contra processos de gentrificação e outras causas onde foi TRETA mesmo com os gambé, aprender coisas práticas de elétrica, hidráulica e macetes em uma casa onde se respira e vive o faça você mesmo 24/7. Foi aqui também que me livrei dos entorpecentes, mantendo a mente ocupada, um olhar crítico e uma escola do caralho por viver em uma cidade como São Paulo por anos.

Após alguns anos ativo no coletivo, a imagem da utopia que eu tinha foi lentamente se desfazendo e no final das contas, filha da puta tem em todo lugar. Também achei que era hora de ter um pico pra morar pois você vai ficando velho e sem paciência para limpar, ou pedir para limpar dependendo do caso e me mudei de lá, mas continuo indo no pico e encontrando os amigos normalmente.

Depois de quase 10 anos aqui, aprendi um novo idioma, cultura, as escrotices da sociedade alemã e europeia (principalmente com gente da áfrica e américa do sul), me apaixonei, viajei por quase todo o continente, trabalhei em um monte de coisa e vendi um pouco de droga, enfim, vivendo. Em certo ponto fui me desligando gradativamente do Brasil, no que diz respeito à acompanhar notícias e ficar falando com amigos daí o tempo todo ou reclamando da comida ou do clima aqui. Precisava estar imerso ou entao nao iria funcionar pra mim. Todo esse aprendizado e experiência, graças à uma porção de fatores, algumas pessoas e um pouco de sorte, não seria possível se não fosse essa fascinação quando eu era pivete com essa porra toda, pra usar o bom português. No final das contas, nunca é apenas som. Viva sua vida e nunca é tarde pra mudar algo se está insatisfeito. Eu sou apenas mais um.

Valeu se você chegou até aqui. Próxima vez prometo que vou falar de som. Até breve, Gratidão. (TO ZUANDO!!!) por favor, parem de usar a palavra GRATIDÃO MEO.

bjs de luz, Cau-Z

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